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Capítulo 1: Última Transmissão Humana

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Algures no ano dois mil e oitenta...

Eu fui o único sobrevivente não contaminado de um grave acidente biológico que ocorreu no laboratório de genoma humano da “GenoTech“, empresa de pesquisa molecular sediada na segunda colónia a norte de Marte, perto da vasta planície de "Vastitas Borealis".
No primeiro dia do ano, um grupo de climatólogos russo descobriu através de imagens chocantes captadas pelo seu satélite: Resurs Dk-1 lançado em 2006, que as inúmeras calotes glaciares do Pólo Norte estavam a derreter parcialmente. Todos os governos mundiais accionaram desde logo os respectivos planos de emergência de cada Estado, iniciando rapidamente uma cooperação a nível global sem precedentes.
Quando recebemos a notícia na sede da "GenoTech" em Marte, eu estava sentado na minha secretária de contraplacado preta, macia ao toque, com o meu laptop “Dell“ novinho em folha a fazer um "check-up" de rotina ao sistema de vídeo-vigilância. Sim, não vos disse ainda, chamo-me "Haiden" e sou um programador informático; contratado pela "GenoTech" para fazer a manutenção do seu sistema de segurança e assegurar que não existem falhas técnicas no circuito informatizado.
Fiquei aterrorizado ao escutar o bloco informativo especial que acabava de ser transmitido em directo do planeta Terra e caí desamparado no chão com as mãos enterradas na cabeça.Ali permaneci momentaneamente, petrificado como uma estátua de pedra perdida num mundo sem tempo, estático, imóvel, como um enfermo induzido num estado de coma vígil. O ardor da retina incendiava as minhas lágrimas salgadas de dor que morriam antes de formarem uma gota, perante aquela evidência tão seca, ríspida e profunda. De repente, voltei a mim abanado violentamente pelo meu chefe superior. Eu bem via os olhos dele negros como a noite, sedentos de loucura e os de toda a gente em meu redor; numa correria parva em mil e uma direcções que mais parecia uma autêntica excursão de formigueiros psicóticos, atropelando-se mutuamente, pisando-se individualmente num ensejo angustiante por novidades dos seus familiares mais próximos, tal como eu. Contudo, apesar do panorama caótico eu permanecia mais calmo, consciente, com uma visão ampliada das coisas, com o sangue semi-frio quase a brotar-me das veias. E foi no meio de todo o pânico, desespero, inquietação, daquele arrepio gelado e metálico que apanha a espinha dorsal por completo, que a tragédia aconteceu e tudo voltou a parar à minha volta como se tivesse accionado um botão para colocar o tempo em "slow-motion". Fixei com a precisão de um poderoso telescópio, de forma precisa e inequívoca, os corpos inocentes de dois cientistas a serem projectados como pequenos sólidos de plástico contra o vidro acrílico que protegia o novo complexo molecular, que estava a ser desenvolvido para fins terapêuticos em pacientes terminais, altamente secreto e contagioso. Naquela fracção de segundo fui directamente ao Inferno numa viagem gratuita paga por Satanás em pessoa; ao presenciar os esqueletos ingénuos, frágeis e delicados, dos meus colegas a transformarem-se em criaturas deformadas, autênticos mutantes humanos. A debilidade dos seus membros suplicantes e os berros ensurdecedores de ajuda audíveis a quilómetros de distância, acobardavam qualquer tentativa altruísta; enquanto a pele desvanecia no contacto cutâneo com o reagente químico, descolorando um organismo que outrora fora perfeito, semelhante ao meu.
Comecei a correr sem olhar para trás, com toda a força que ainda me restava nos músculos; no meio daquela contaminação crescente, por entre mãos entreabertas, pernas cruzadas e suores escorregadios, pressionado pela contagem de quarentena decrescente de cinco minutos irreversíveis, até conseguir alcançar a porta branca e futurista à prova de bala. Fui sozinho, mas paguei o pesado preço da salvação, ao ser obrigado a assistir à devastação dos meus companheiros de trabalho pela sua própria criação.

A Continuar...

Edição de Imagem: Ema Modesto

Última Transmissão Humana © 2013. Todos Os Direitos Reservados.

3 comentários:

Anónimo disse...

Por entre orações tão elaboradas e complexamente tecidas, o meu intelecto permaneceu impávido e imóvel, tamanha qualidade e superlatividade destas ideias que, como moléculas microscópicas num habitat líquido e semi-viscoso, navegam em imposição de saber.

Jamais a escrita de ficção científica em Português logrou tal feito, ainda que em verso humilde celebrado, parafraseando o velho sábio da poesia portuguesa, promulgam uma nova fase na evolução conceptual, no leve erotismo das descrições assoberbadas por um estilo ímpar e sem precedente - penso que tal elogio o produzo de forma unânime e inequívoca.

Se esta é a última transmissão humana, então que se apresse o término da nossa espécie. Parabéns, 10/10.

Anónimo disse...

Tou sem palavras para descrever o que li para além do óbvio.
Gostei muito desta nova experiência, cativante.
=)
Parabéns pelo trabalho

Anónimo disse...

Estes textos estão mt mt interessantes.
Jamais diria que são feitos por uma pessoa tão jovem!!
Caramba, parabéns!;)

 
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